Advogado do Sindsalem, Pedro Duailib, comenta opção do Governo de retirar 1/5 dos vencimentos dos servidores.
Recentemente as Segundas Câmaras Reunidas do Tribunal de Justiça do Maranhão acolheram uma rescisória desconstituindo decisão que entendeu que a revisão de vencimentos dos servidores deve ser na mesma data e no mesmo percentual. Em seguida o Governo do Estado, na tentativa de justificar a ação rescisória, através de jornais e redes sociais emitiu notas afirmando que a interpretação da Lei Estadual nº8.369/2006 pelo Tribunal de Justiça do Maranhão em mais de 1.040 processos teria sido inconstitucional e destoante do que preceitua o art. 37, X da Constituição Federal.
Acostumado, na minha labuta diária, a respeitar as decisões judiciais, sejam elas favoráveis ou desfavoráveis ao intento dos meus constituintes, não sou de comentá-las, apenas delas recorrer sem alardes e de forma respeitosa com a decisão e com os vencidos. Porém, no caso concreto, em face das desinformações do Governo e da tentativa forçada de fazer valer uma versão destoante da realidade, como querendo tripudiar dos vencidos, os servidores públicos, resolvi falar fora do processo.
A Lei Estadual nº8.369/2006 fez a revisão geral de remuneração dos servidores estaduais de forma diferenciada, a saber: concedeu revisão geral de 30% para os servidores de nível superior (com maior salário) e de 8,3% para os servidores de níveis fundamento e médio.
A referida lei dispõe “sobre reajuste da remuneração dos servidores públicos estaduais civis e militares, e dá outras providencias” e em seu artigo primeiro diz que ela é destinada a reajustar os salários dos servidores do “Poder Executivo, da administração direta, autárquica e funcional, dos Poderes Legislativos e Judiciário e do Ministério Público”. Portanto a referida lei foi destinada a todos os servidores, sendo lei geral de revisão de vencimentos, nos moldes do art. 37, X da Constituição Federal, que dispõe:
“X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (Regulamento).”
O artigo acima condensa as duas regras de alteração de vencimentos de servidores: uma é o estabelecimento de padrão remuneratório por lei específica com iniciativa de cada poder, conforme o caso, que está vinculada a alteração ou estabelecimento de planos de carreiras, cargos e vencimentos; outra, última parte do artigo, destinada a reposição da inflação de iniciativa do Poder Executivo destinada a todos os servidores públicos sem distinção de índices na mesma data, garantia constitucional cidadã dos servidores para manutenção do poder de compra dos seus vencimentos.
De 1995 a 2005 o Estado do Maranhão desrespeitou a determinação constitucional e não reajustou os salários dos seus servidores que, no período acumularam perdas salariais de mais de 104%, ou seja, tiveram seus salários diminuídos pela metade.
A Lei n.º 8.369/2006, como antes referido, recompôs parte das perdas concedendo o reajuste de 30% para os servidores de nível superior e de 8,3% para os servidores com menor salário (nível fundamental e médio), ou seja, descumpriu a determinação constitucional de reajuste na mesma data, com o mesmo índice e para todos os servidores, privilegiando os servidores com maior salário.
Para respeitar a determinação constitucional e de acordo com precedentes do Supremo Tribunal Federal, as entidades dos servidores públicos buscaram tratamento isonômico na forma constitucional e chancelado pelo Supremo Tribunal Federal.
O Tribunal de Justiça do Maranhão, de forma constitucional e na esteira da dicção do Supremo Tribunal Federal, garantiu aos servidores de nível fundamental e médio o reajuste de 21,7% (diferença entre 30% concedidos aos servidores de nível superior e 8,3% concedido aos servidores de níveis fundamental e médio. Decisões confirmadas pelo Supremo Tribunal Federal e muitas já executadas, ou seja, incorporadas aos vencimentos dos servidores e expedidas precatórios).
O Estado do Maranhão, de forma legítima e republicana, recorreu a todas as instâncias do Poder Judiciário, primeiro grau, Tribunal de Justiça do Maranhão e Supremo Tribunal Federal, tendo nove ministros do STF afirmado que não há desrespeito a matéria constitucional nas decisões do Tribunal de Justiça do Maranhão. Porém, agora, de forma forçada, o Estado do Maranhão, apresenta argumentos econômicos e tese de suposto comprometimento da Constituição Federal e da Súmula 37 do STF.
Um dos princípios basilares de qualquer estado de direito é a segurança jurídica, sendo um dos seus pilares o respeito à coisa julgada, valor constitucional (art. 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;) que garante a todos os cidadãos a segurança ao seu direito após ele ter sido sedimentado por decisões judiciais submetidas a todas as instâncias do Judiciário.
Entendíamos que, após a exaustiva peleja jurídica de nove anos dos servidores que tiveram parte dos seus vencimentos suprimidos a questão estava resolvida, restando ao Governo do Estado, em nome da estabilidade e segurança das relações jurídicas, se curvar as determinações judiciais, partindo para a concretização do direito ou para uma composição como fez o Poder Executivo Federal na questão dos 28,86% dividindo o passivo em 07(sete) anos.
Argumentos do Governo
a) Suposto desrespeito ao art. 37, X da Constituição Federal e da Súmula Vinculante 37 do Supremo Tribunal Federal: ao contrário do que afirma o Estado, o art. 37, X da CF na sua parte final (assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices ) garante reposição inflacionária de forma igual para todos os servidores em caso de revisão geral por lei de iniciativa do Poder Executivo, caso da Lei Estadual nº8.369/2006. Por outro lado, a Súmula Vinculante nº37 do STF, em face do princípio constitucional da legalidade, proíbe o Judiciário de instituir regra para alterar remuneração de servidor, o que não é o caso concreto, em que existe a lei de revisão, porém ela trata de forma diferenciada servidores nas mesmas condições, o que é proibido (art. 37, X, da CF, parte final), ou seja, o Poder Judiciário do Maranhão ao analisar os milhares de casos não criou a regra, apenas adaptou a lei ao que determina a Constituição, proibindo tratamento diferenciado em caso de revisão geral.
b) Argumento econômico: não há dúvida de que os servidores tiveram peras salariais por falta de reajuste por mais de dez anos que supera o percentual de 100%(INPC); também não há dúvida quanto a necessidade de recomposição dos salários dos servidores de nível médio e fundamental que não podem, por imposição constitucional e por justiça social, terem tratamento discriminatório. Por outro lado, o Judiciário, independente de argumento econômico, existe para declarar o direito, não podendo, sob pena de comprometer a sua independência, antes de reconhecer o direito na forma da lei, analisar capacidade econômica do demandado.
Os números apresentados pelo Governo do Estado do Maranhão são falaciosos, vez que, de forma genérica e sem qualquer demonstrativo, alega que as decisões atingem todos os servidores do Estado e a conta chega a astronômica cifra de 4,7 bilhões. Na verdade as decisões excluem os servidores de nível superior e de várias outras categorias, sendo o seu custo estimado em menos de um bilhão, valor que será pago paulatina e anualmente, através de precatórios, ou seja, a conta chega a 6% de um ano de arrecadação do Estado e será diluída por vários anos.
Por fim, o Maranhão, segundo levantamento do Conselho Nacional de Justiça, é o Estado com menor dívida de precatórios da federação, mais um fato que não foi considerado na escolha deliberada do Governo do Estado para supressão de direitos.
Resta aos servidores a insegurança com um Governo que desconsidera a estabilidade das relações jurídicas com os seus administrados, bem como a amarga lembrança, a cada mês e pelo restante da vida, da retirada de um quinto de seus vencimentos.
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